[18 de abril de 2011]

Desafios para o Jornalismo na Era da Hiperconexão

web2_network.jpgEsse foi o título de uma discussão que eu iniciei no evento de jornalismo da Unisinos, buscando discutir os desafios para o jornalismo no mundo hiperconectado pelas redes sociais na Internet. Algumas dessas idéias eu queria colocar aqui no blog. :-)

Esse mundo hiperconectado é aquele onde as tecnologias digitais, enquanto suporte, e principalmente através dos sites com princípio em redes sociais, fizeram-nos permanentemente conectados a outras pessoas. Mesmo quando não estamos online, nossas conexões permanecem e podem recuperar as informações divulgadas por nossa rede a qualquer momento. Isso significa que as conexões nesses sites são canais de informações sempre ativos e que nos mantêm recebendo informações de forma síncrona e assíncrona. (E essas informações podem vir não apenas pelo computador, mas também pelos tablets, smartphones e celulares.) Passamos, assim, a viver um informational overload, ou um momento onde as informações nos sobrecarregam. São informações demais, requerendo atenção demais e com um grande custo para que consigamos mantermo-nos informados.

Filtrar e Organizar as Informações

Nesse contexto surge o que eu considero o primeiro desafio do jornalismo: ser um filtro. Filtrar e organizar a informação, priorizando e aprofundando aquelas que são mais relevantes para a população. Trazer o que há de relevante e não mais a novidade. A era do "furo" acabou. Nenhum jornalista consegue competir com 500 milhões de fontes (que é, por exempo, a população do Facebook) que estão diretamente conectadas às audiências. O novo desafio, que a meu ver cabe ao jornalismo, é organizar o caos informacional, desenhando o espaço social, trazendo as informações relevantes em determinados espaços, contextos e locais (sim, locais, porque o jornalismo precisa ser também hiperlocal).

A Credibilidade é o maior Valor

O jornalismo tem consigo uma certa função e um compromisso social. Por isso, recebe credibilidade da população (que é uma forma de capital social). Na era da hiperconexão, esse capital social é mais importante do que nunca. O cuidado para com as informações que são publicadas, o cuidado para com a averiguação dos fatos e o cuidado para com o aprofundamento dos mesmos é que faz o jornalismo relevante num mundo onde qualquer um pode dar uma notícia. No entanto, a busca - infrutífera e desenfreada - pelo furo, que continua pautando muitas redações, focada exclusivamente na velocidade, acaba prejudicando o próprio jornalismo. Com a pressão pela velocidade, mais e mais "barrigadas" são dadas pelos jornais. Ao mesmo tempo, a pressão pela velocidade faz com que qualquer coisa seja publicada, apenas para "preencher" o espaço. Entretanto, o fato de que não há mais a limitação da matéria e que tudo possa ser publicado não significa que tudo DEVA ser publicado. Publicar qualquer coisa tem feito dos jornais online menos um espaço de credibilidade e mais um espaço de lixo informativo. A pressão pelas notícias faz com que informações sejam publicadas sem nenhum critério, criando gigantescos espaços de desinformacão. O jornalismo, assim, mata-se a si mesmo. :P Se os jornais se igualarem às informações que circulam nas redes sociais, perdem capital social. Perdem credibilidade. Passam a ceder seu lugar a outras práticas, mais coletivas, que tentam chegar onde os jornais estão abdicando de ir (como os coletivos de informação, por exemplo). O segundo desafio, portanto, é manter a relevância pelo compromisso social. As redes sociais não têm compromisso com a sociedade. As pessoas informam o que lhes interessa, não o que é relevante para a sociedade. Esse é (ou era para ser) o espaço do jornalismo.

Tornar o Jornalismo Conversacional

A hiperconexão pode fazer das redes sociais um espaço para o debate e a conversação. O próprio jornalismo está, também, criando um espaço de debates, fazendo com que as discussões possam acontecer no ciberespaço. Tornar o jornalismo mais dialógico, mais aberto para a sociedade (utilizando as redes como fontes, como medidas e como espaço de debates) pode ser também proveitosa para ambos. As redes podem atuar como reverberadoras das informações, pauteiras de coisas que são relevantes para as populações e como esfera de debates. A abertura para essa conversação ainda é um desafio para o jornalismo.

Tentei resumir um pouco daquilo que eu defendi no evento. Um tanto superficiais e um tanto cruas, essas são as idéias a respeito dos desafios para o jornalismo no espaço dominado pelas redes sociais hiperconectadas. :) Tem vários intertextos que eu estou refletindo sobre aqui, como os conceitos de mídias locativas e espaço informacional do André Lemos e as mudanças de suporte e o impacto no jornalismo do Marcos Palacios e da Luciana Mielniczuk e etc. Mas, como eu disse, esse é um rascunho de idéias para a discussão. :)
por raquel (08:24) [comentar este post]


Comentários

Nepomuceno (abril 19, 2011 3:52 AM) disse:

Raquel, ser um filtro, concordo 100%, vou espalhar o artigo, grato. Nepô.

Mônica Vitória (abril 20, 2011 10:21 AM) disse:

Perfeito! É exatamente o que penso. Para sobreviver, o jornalismo precisa mudar, como o mundo mudou, como o modo de viver da sociedade mudou. Mas é difícil tentar convencer quem tem a cabeça no século passado disso. E isto nem deveria ser novidade. O que acontece é que a imprensa esqueceu da principal função do "gatekeeper". Estão mais ligados à rapidez, porque acham que "internet é velocidade, instantaneidade, por isso os jornais também devem ser rápidos, antes de mais nada", e não é bem assim. Não percebem que isso é um tiro no pé.


Raquel, sou fã de seus textos desde a época da faculdade, e você foi uma das principais fontes qeu usei em minha monografia. E é uma das poucas pessoas que me fazem, ainda hoje, ter vontade de "largar tudo" e seguir na área acadêmica. Parabéns pelo trabalho competente, atual, sensato e interessante.

Alessandra (maio 5, 2011 1:28 PM) disse:

Parabéns, gostei muito da matéria!

Tatiane Pires (junho 6, 2011 8:52 AM) disse:

Não acho que o jornalismo deva ser um filtro. Não quero que redação alguma decida o que eu devo saber ou não. Esse comportamento (de escolha) dentro das redações é um dos fatores que faz das grandes empresas de mídia hoje espaços de desinformação.

Vou dar um exemplo com o que está ocorrendo em Minas Gerais [1]. Foi necessária uma representação no Ministério Público Federal contra o senador Aécio Neves [2], porque no âmbito estadual tanto a imprensa quanto a justiça(?!?!?) foram silenciados.

O jornalismo factual está seriamente comprometido. O que se vê é uma "versão única" das "notícias" em diversos meios de comunicação.

De jornalistas como Azenha[3] e Paulo Henrique Amorim[4] a portais colaborativos como o Teia Livre[5], hoje minha principal fonte de informação são blogs. Quando alguém comenta alguma notícia que saiu na "imprensa" tradicional, já li sobre o fato.

Não sou contra a Imprensa nem o jornalismo. Mas ambos precisam de regulamentação (contra a propriedade cruzada, por exemplo) para que possam se reinventar e reconquistar credibilidade.


[1] http://www.minassemcensura.com.br/
[2] http://www.viomundo.com.br/politica/bloco-minas-sem-censura-representa-contra-aecio-neves-no-mpf.html
[3] http://www.viomundo.com.br
[4] http://www.conversaafiada.com.br/
[5] http://www.teialivre.com.br/

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